Na manhã da última terça-feira, 29 de abril, dezenas de agricultores familiares de Assis e região se reuniram na sede da Associação dos Produtores Rurais do Município de Assis e Região (Aprumar) para protestar contra a suspensão da compra de alimentos por parte da Prefeitura. Desde janeiro, nenhum produto foi adquirido para abastecer a merenda escolar ou programas de assistência alimentar, afetando diretamente pequenos produtores que forneciam hortifrútis, leite e polpas de frutas ao município por meio dos programas federais PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar) e PAA (Programa de Aquisição de Alimentos).
A interrupção tem causado perdas financeiras, paralisação de hortas e da produção leiteira, além de revolta entre os produtores. “Parei tudo. Irrigação, roça, plantação. Está tudo parado porque não tem pra quem vender”, contou Ariovaldo Piovesani, produtor da Água Funda, em Assis. Ele fornecia hortaliças há cerca de 20 anos e relatou indignação com a aquisição de alimentos de fora da cidade: “Pagamos imposto aqui. É revoltante ver a Prefeitura comprando de Marília enquanto o nosso produto apodrece no sítio”, ressaltou.
Outro produtor assisense, Sidmar Pontes, do bairro Água da Fortuna, afirmou que até mesmo polpas de frutas estão paradas na fábrica que gerencia com a família. “Tem produto perdendo, a gente não consegue entregar e não tem resposta. É um sentimento de tristeza. O pequeno produtor depende desses programas”, disse.
“Nós produzimos com qualidade, investimos, adubamos o solo, e agora está tudo parado. É muito injusto”, afirmou Carlos Melo, produtor da Água do Fogo, em Cândido Mota. Em entrevista ao Portal Assis, ele contou que fornecia hortaliças para a rede municipal. “Nós fizemos um grande investimento em irrigação, preparamos toda a terra para plantar mas com esse cenário de indecisão, plantamos pouco. Trabalhamos com muito esforço e estamos sendo deixado de lado”, criticou.
José Roberto Alves, de Cândido Mota, também deixou de plantar. “Produzimos 27 itens de hortaliças e folhas. A Prefeitura não nos chama para conversar, não dá retorno, e a gente tem contas a pagar, filhos pra criar. Ninguém vive sem dinheiro. A gente pagava uma taxa para a Aprumar, sim, mas pra nós era uma segurança. Eles cuidam da burocracia. A associação sempre esteve do nosso lado e nos fortalece”, disse o produtor.
Impacto social e desperdício
Além dos impactos econômicos, os agricultores apontam que a paralisação atinge diretamente mais de 300 famílias em situação de vulnerabilidade social, que deixaram de receber cestas com alimentos frescos da agricultura familiar. “Essas famílias sumiram? Deixaram de existir? É muito triste, porque o projeto alimentava pessoas e movimentava a economia local”, disse José Fernandes, produtor rural e ex-prefeito de Assis.
Ele também criticou a substituição do leite pasteurizado produzido por cooperados locais por leite em pó de origem desconhecida. “Temos uma bacia leiteira rica, mas as crianças da rede municipal estão consumindo leite industrializado de fora. Isso é inaceitável.”
O Portal AssisCity apurou a informação e confirmou que o leite pasteurizado vinha sendo priorizado nas 13 creches da cidade, especialmente pela qualidade nutricional e por ser mais adequado para o preparo de mamadeiras e papinhas. Mas, desde o início do ano, houve uma mudança por leite em pó e que este tipo de leite, que é enriquecido com vitaminas e minerais, agora está atendendo toda a rede municipal e estadual.
Reivindicações
Durante a reunião, o advogado da Aprumar, Ivan Serra, destacou a necessidade de diálogo com o atual governo e defendeu a continuidade dos contratos com base em resultados comprovados nos últimos anos.
A Aprumar alerta ainda que, se o município não cumprir a exigência legal de aplicar ao menos 30% dos recursos da alimentação escolar na agricultura familiar, poderá ter que devolver os recursos ao Governo Federal.
Prefeita se posiciona sobre o tema
Em entrevista concedida à Rádio Difusora de Assis na manhã desta quarta-feira, 30, a prefeita de Assis, Telma Spera, comentou o atraso nos contratos e afirmou que a gestão está promovendo uma reestruturação dos programas de alimentação. Segundo ela, a intenção é democratizar o acesso dos produtores, sem intermediações e cobranças de taxas. “Não queremos nenhum tipo de intermediação. A partir de agora, não vai haver mais nenhuma cobrança. O produtor rural tem que vender seu produto e receber o dinheiro na íntegra”, declarou. A prefeita também negou falta de diálogo com os agricultores. “Nos reunimos com vários produtores, muitos foram ao gabinete. Aqueles que disseram não participar é porque, segundo eles mesmos, não valia a pena.”
Ela ainda afirmou que o foco será nos produtores de Assis, priorizando-os antes de adquirir alimentos de outras cidades, como permite a lei. “Assis não deu conta, aí sim se pode comprar de fora. Mas queremos contemplar os assisenses. O nosso foco é renda no bolso do produtor local, de forma democrática”, frisou.
A prefeita destacou ainda que um novo projeto de lei foi enviado à Câmara com regras atualizadas e previsão de uma comissão de fiscalização. “Se está demorando um pouco, é porque estamos fazendo o que é certo. Os projetos foram para a Câmara, e os vereadores estão entendendo a necessidade de beneficiar o produtor de Assis”, disse Telma.
Nova lei
O projeto de lei citado pela prefeita na entrevista também foi lembrado pelo presidente da Câmara Municipal de Assis, Paulo Matioli, que esteve presente na reunião. Ele informou que projeto de lei foi protocolado em regime de urgência e que trata da aquisição de alimentos. O texto ainda será analisado pelas comissões da Câmara e poderá ser votado em maio. “É importante o diálogo. Vamos buscar entender o que está acontecendo e garantir que bons projetos tenham continuidade”, afirmou Matioli.
No entanto, José Fernandes alertou que o novo projeto pode ampliar o acesso de médios e grandes produtores aos programas, descaracterizando a política pública original. “Isso fere a lei federal do PNAE. Grandes produtores já têm mercado. O programa é para proteger o pequeno agricultor, que tem dificuldade de competir no sistema convencional. Do jeito que está, o projeto é inconstitucional.”
O vereador Gordinho da Farmácia, que também esteve presente na reunião, também criticou a omissão da Prefeitura. “Tem produto estragando, banana apodrecendo. Não é possível que, em cinco meses, nada tenha sido comprado. Vamos cobrar isso na tribuna”, finalizou.
Fonte: AssisCity